sexta-feira, 26 de novembro de 2010

Mais uma vez ativismo

 

Esta semana entrou em cena novamente o tema do ativismo judicial, por meio de Maria Inês Nassif e do Presidente Lula. Este afirmou que “A gente não pode indicar as pessoas pensando na próxima votação na Suprema Corte. A gente não pode indicar uma pessoa pensando nos processos que vai ter contra o presidente da República. Você tem que indicar a pessoa pensando o seguinte: se a pessoa é ou não competente para exercer aquele cargo. E tem gente de direita, gente de esquerda.” Aquela “No espaço que acabou deixando a descoberto, floresceu o ativismo judicial - entenda-se do Judiciário - que tem abarcado funções do Legislativo e do próprio MP e se espelha numa ideologia conservadora, principalmente no âmbito político-eleitoral, de tutela da democracia e do voto.”

O teor da afirmação de Maria Inês Nassif deve levantar novamente o questionamento sobre o que é o ativismo judicial e se este pode, de fato, ser conservador, bem como de que maneira.

Por ativismo judicial entendo uma prática decisória que entende ser inxetrincável a relação entre política e direito. Tal prática age de modo confesso políticamente e não se pode falar em tese de ativismo de esquerda ou de direita, ele não é em si mesmo conservador ou progressista. O Judiciário  numa postura ativista passa a influenciar diretamente nas competências dos outros poderes por meio da primazia conferida aos direitos individuais – por meio da interpretação dos direitos individuais – influenciando assim as políticas públicas e as decisões do Legislativo.

Tal processo não decorre especificamente da inércia dos outros poderes ou de espaços descobertos, mas sim do próprio texto constitucional que alargou sobejamente as competências funcionais no âmbito do Estado e legou normas abertas que exigem apropriação conteúdistica para deixarem de ser meros conselhos morais. Assim, o ativismo não pode ser conservador salvo na medida em que as instituições são conservadoras ou progressistas.

No texto de Maria Inês Nassif são descarregadas sobre as instituições as pressões por por direitos de classes econômicas que acedem à cidadania e “O Judiciário, ao assumir a tutela dos demais Poderes, tem muitas vezes se constituído numa barreira conservadora à inclusão, de fato, das classes menos privilegiadas.”

Há, portanto, segundo a autora um processo de infantilização da sociedade, como se o processo de inclusão econômica fosse o suficiente para incluir na cidadania e elevar os membros da sociedade civil à condição de “clientes dos serviços públicos”, para utilizar a terminologia indicada no texto.

Ocorre que é necessário observar as condições reais do espaço público e a amplitude da liberdade do comércio de idéias e formação da vontade política por meio de argumentos pragmáticos, bem como a capacidade de construir compromissos sociais e desenvolver uma autocompreensão social sobre o teor das normas abertas. Nestes quesitos o espaço público brasileiro continua sendo compatível com uma democracia de baixa intensidade e a capacidade de fazer valer os melhores argumentos continua mínima.

Assim, avaliar o papel do judiciário no varejo ou em um sentido amplamente lato como o realizado pela autora não é a melhor saída para falar do papel do ativismo ou da capacidade das intituições brasileiras para iniciar o processo de acomodação desta nova parcela da sociedade que progressivamente passa a participar do processo democrático. Em suma, mesmo que se admita a tese da infantilização, é dever precípuo perceber que é dever do Judiciário a tutela dos direitos e, conseqüentemente, dos outros Poderes. Trata-se de saber qual o modo desta tutela e ela será mais frouxa ou mais estreita conforme a capacidade da população para preencher as condições que descrevi acima.

A passagem de um Judiciário dirigente para um Judiciário procedimental, ou seja, que atuará a fim de garantir a ampliação do espaço de comunicação é diretamente relacionada com a capacidade da sociedade de estabelecer compromissos e definir para si mesma programas e diretrizes por meios argumentativos. De tal sorte que, se ainda não é assim é por que a sociedade não foi capaz de se apropriar dos espaços públicos, inclusive, do Judiciário e estabelecer compromissos.

A declaração do Presidente Lula é de bom alvitre por que revela que a política judiciária não se dá, exceto no varejo, entre esquerda e direita no sentido tradicional  mas sim sobre o cumprimento efetivo daquilo que devido ao poder judiciário, ou seja, ampliar a comunidade de intérpretes e disseminar a prática de participação na tomada de decisões, sendo, neste caso, este o paradigma da esquerda ou direita. Desta feita um bom juiz, exitoso, necessariamente será aquele que fundamentar razoávelmente seus julgados, garantir a estabilidade das decisões e ampliar o espaço de participação pública dos cidadãos assegurando os direitos e os procedimentos necessários a isto.

Por fim, devo consignar, em concordância com Maria Inês Nassif, que a solução está num amplo debate que garanta as condições necessárias para que a população possa se apropriar das suas instituições e valorizar o debate democrático, diminuindo assim o papel do Juiz na sociedade. Contudo, entendo que nos últimos anos o Judiciário vem cumprindo um papel importante – com erros e acertos – tanto na ampliação de direitos quanto na defesa procedimental da democracia. Cito quanto a ampliação de direitos a garantia do direito à greve dos funcionários públicos e a inconstitucionalidade da Lei de imprensa da Ditadura, bem como a tutela da saúde. Por seu turno, quanto ao procedimento democrático podemos mencionar na política partidária a verticalização, a queda da cláusula de barreira e o estabelecimento da fidelidade partidária.

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