segunda-feira, 8 de novembro de 2010

Terreno da Anarquia legal – Rafael Mesquita

Texto reproduzido do Vermelho 

O Brasil tem uma série de leis e normas que regulam a comunicação mas que foram, ao longo das duas últimas décadas, sistematicamente derrubadas, modificadas ou não colocadas em prática, em nome da desregulamentação do setor.

Levando em conta os últimos episódios, lembramos que em 2009 o Supremo Tribunal Federal (STF) extinguiu a Lei de Imprensa e a formação superior como acesso à profissão de jornalista. Em 1996, o Código Brasileiro de Telecomunicações (lei 4.117) foi modificado, oportunizando que empresas estatais de telecomunicações pudessem ser privatizadas. O mesmo código voltou a ser modificado em 2002, para permitir a entrada de capital estrangeiro nas empresas de comunicação (até 30%). Em 2004, os conglomerados de mídia fizerem campanha contra o projeto de lei encaminhado pelo presidente Lula ao Congresso que previa a criação do Conselho Federal de Jornalismo (CFJ), depois arquivado na Câmara dos Deputados.

Vigora em nosso país não a liberdade de imprensa, mas a “liberdade de empresa”. Vivemos um caso particular, diferente de quase todas as grandes democracias do mundo, como as nações da Europa e da América, que têm efetivos meios de regulação de sua comunicação e uma administração mais eficiente e transparente de questões como as concessões públicas de rádio e TV.

Importantes artigos do capítulo V, que trata da Comunicação Social em nossa Constituição, não estão regulamentados. O artigo 220, que proíbe oligopólios e monopólios, e o artigo 221, que trata dos desígnios educativos e culturais da programação, do fomento a produção independente, da criação regional e da distribuição das verbas publicitárias, são exemplos disso. Faltam também dispositivos que proíbam a propriedade cruzada, na qual um empresário (ou família) é proprietário de mais de um veículo de comunicação, assim como o controle por grupos econômicos.

Como se observa, toda tentativa de discussão, desenvolvimento e acompanhamento da sociedade sob os meios de comunicação são deliberadamente alvo de oposição de grande parte dos veículos da comunicação industrial. Enxergamos que todos esses mecanismos legais permanecem como “lei morta” devido ao fato de não participarem de uma política nacional que considere todos os aspectos da comunicação, nem uma lei geral, que seriam possíveis a partir da criação do Conselho Nacional de Comunicação e os seus correlatos nos estados.

Não avançamos com os conselhos de comunicação e estamos numa crescente perda de direitos, porque mexemos com grandes interesses comerciais, e o perigo reside no fato de serem os meios de comunicação protagonistas na formação de valores da opinião pública. Permanecendo nesse contexto, continuaremos tendo uma mídia fomentadora do ímpeto segregatório, com uma visão de mundo montada no masculino e sendo ideologicamente sexista, heterossexual, branca, urbana, aristocrática e cristã.

Em pleno o século XXI, o Brasil não pode continuar numa visão anacrônica e desregulamentada de sua comunicação. Por isso, devemos reafirmar a proposta de conjugar a busca de diálogo entre autoridades, empresários do setor, governantes e movimentos sociais, para aprovação das teses que propõem um avanço na formulação de políticas de comunicação, entendendo estas não como censura, mas como dimensões estratégicas para o aprofundamento das igualdades democráticas.

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